Recebi esse texto do Leonardo Morel que, além de músico, está fazendo sua tese de pós-graduação sobre os novos modos de se consumir música. Ele acabou de ler "O Culto do Amador" do Andrew Keen - já citado outras vezes aqui - e fez uma pequena análise do livro para nós.
O CULTO DO AMADOR
Em “O culto do amador” (Rio de Janeiro, editora Zahar, 2009), Andrew Keen defende que o modelo de democratização adotado pela internet nos dias de hoje, também conhecido como Web 2.0, contribui para a degradação da sociedade do século XXI. Segundo ele, a Web 2.0 daria poder de voz a indivíduos sem especialização, definidos por ele como “amadores”, e acarretaria o declínio de nichos mercadológicos como a indústria fonográfica e a imprensa especializada.
Na visão dele, plataformas como Myspace, Wikipédia e Youtube são responsáveis pela degradação de valores culturais e pela eliminação de postos de trabalho de profissionais e especialistas.
Em períodos de mudança é natural que algumas pessoas glorifiquem o passado, idealizando-o como parte de um território seguro onde não havia problemas e todos eram felizes. Atualmente encontramos frequentemente essa posição sendo defendida por indivíduos dos mais variados segmentos profissionais que enxergam esse momento de transição como a realização do caos.
Ora, o homem cria a tecnologia e essa transforma a sociedade, sempre foi assim. A busca pela inovação tecnológica faz parte da história humana e é inevitável que produtos e processos muitas vezes tornem-se obsoletos e simplesmente desapareçam com o tempo.
Numa perspectiva unilateral, o autor parece ignorar os benefícios que plataformas como Myspace, Youtube e Wikipédia geraram paras as pessoas, não conseguindo assim entender os motivos pelos quais tais iniciativas foram tão bem sucedidas nos dias de hoje.
Estamos vivendo num período marcado por inúmeras mudanças na sociedade causadas pelo impacto do processo de inovação tecnológica. A internet, creio eu, ainda necessita de diversos ajustes como uma regulamentação que seja formatada nos moldes atuais e que proporcione o equilíbrio entre os interesses tanto da sociedade quanto os corporativos.
Mesmo assim acho válida a leitura desse livro. Acredito que ele contribui para um debate que ainda está longe de acabar quando o assunto é internet e creio ser importante ouvir (ou ler) os diferentes pontos de vista.
Léo Morel
leonardomorel@gmail.com
http://www.myspace.com/leomorelrj
8 de mai. de 2009
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Leo, eu não li o livro, mas o Andrew Keen me parece menos radical no seu blog que no Culto do Amador.
ResponderExcluirQue argumentos você considera válidos na argumentação dele?
Ricardo, realmente o blog do Andrew Keen, embora crítico, é mais ponderado que o livro, que ainda estou lendo. Aliás, o blog é muito bom.
ResponderExcluirEm relação à análise do Leo, concordo de uma forma geral. Entretanto, tenho uma ou outra observação:
O Leo diz que "Segundo ele(Keen), a Web 2.0 daria poder de voz a indivíduos sem especialização, definidos por ele como “amadores”. Bom, o que vemos é que isso não é uma opinião do Keen. É fato. O que isso tem de positivo e negativo é uma outra história.
Até onde li, não vejo no livro uma glorificação do passado. Acho que ele escolheu um tom panfletário para cutucar as pessoas, chamar a atenção para perigos que realmente existem. E isso ele faz bem, com dados concretos.
Toda revolução (e esta que estamos passando é radical e muito rápida) tem um lado destrutivo, independente do que seja construído depois. Keen questiona o preço pago por essa mudança e o que pode ser feito para que não seja alto demais. Aliás, estamos aqui justamente discutindo soluções para esse estado de coisas, não?
Aqui mesmo no Musicalíquida há dois posts com boas conversas sobre o tema nos comentários. Vejam:
Outro jogoEntrevista com o autor de O Culto do AmadorAbraços!
Os melhores se destacam, sejam eles amadores ou profissionais...
ResponderExcluirCultura Malcriada, quem dera fosse assim tão simples...
ResponderExcluirEste texto abaixo, do Tiago Doria, contextualiza bem O Culto do Amador. Quando foi escrito em 2007, era uma crítica desmistificadora ao estado de coisas excessivamente otimista. MySpace e Youtube ou não existiam ou estavam em seus primórdios. Hoje o livro é até meio óbvio.
ResponderExcluir* * *
Andrew Keen é um escritor que, em 2007, lançou um livro chamado “O culto do amador“, no qual fazia duras críticas a toda cultura e mitificação criada em torno de sites como YouTube, MySpace, blogs e Wikipedia. Na época, foi chamado de anticristo, “traidor do movimento”, dinossauro.
Acho que teve blogueiro e porta-bandeira das mídias sociais que até queimou a foto e os livros de Keen em praça pública. O caso deixou evidente o quanto alguns gurus das novas mídias agem iguais aos da antiga - não querem ou não sabem ouvir críticas.
Com a polêmica, o livro foi traduzido para 12 idiomas. A versão em português (207 páginas) chegou neste mês ao Brasil pela editora Zahar. Mas chegou datado.
Para começar, é preciso deixar algo claro. Keen não é qualquer um. Tentaram desqualificá-lo na época do lançamento do livro alegando que o escritor era um paraquedista em questões envolvendo a internet. Keen foi investidor e empreendendor no Vale do Silício, antes da bolha, em 2001 (lançou o site Audiocafe, de distribuição de música).
Fora isso, era arroz de festa em Foocamps, Barcamps e outros eventos do tipo. Ou seja, é uma crítica vinda de dentro da “web mais colaborativa”.
O livro chega datado em 2009 por que as críticas de Keen soam óbvias atualmente, ou seja, já não são novidade. Segundo Keen, sites como MySpace são um terreno para a prática de diversos crimes, inclusive pedofilia. Conteúdo gerado pelo usuário por si só não é atestado de qualidade. Existe uma confiança excessiva na participação do usuário, como se ela fosse o ’santo graal’ de alguma coisa.
Uma boa parte dos vídeos do YouTube são lixo, coisa que interessa apenas a quem fez. Os blogs estão ajudando a criar novos poderes - de 3 a 4 colunistas de revistas de tecnologia para 5 ou 6 blogs de tecnologia que definem o que é hype e legal na internet.
É um tipo de pensamento que, em 2007, tinha impacto, quando as críticas ao modus operandi da web ainda eram muito escassas.
Em meados de 2007, auge da chamada Web 2.0, seu livro soou como um alerta, uma reação, numa época em que se apontava e glorificava apenas o lado positivo da internet e o discurso tecnopopulista de que qualquer um com um computador poderia se tornar qualquer coisa estava em alta.
Acredito que seja por causa disso que na forma de se expressar no livro Keen é seco, direto e monótono. Repete a mesma idéia várias vezes nos primeiros capítulos, o que o torna cansativo. Parece um panfleto, é nervoso em alguns momentos. É mais reação que qualquer outra coisa.
Ele quer a todo custo que apoiemos as suas idéias e estejamos ao seu lado. Neste sentido, lembra um pouco o trabalho do cineasta Michael Moore.
Por isso que se você quiser críticas mais embasadas e profundas em relação à internet e à “revolução digital”, apesar da fama, “O culto do amador” com certeza não é o livro mais indicado.
Howard Rheingold, que é contra a atual crença exagerada em torno do poder das redes sociais, Michael L. Dertouzos, do MIT, já falecido, mas que fez críticas ainda atuais, e Nicholas Carr, por exemplo, fazem (ou fizeram) um trabalho bem melhor.
Keen se perde totalmente nos capítulos 4 e 5, nos quais aborda as transformações nas indústrias fonográfica e de cinema. Segundo ele, a hora em que as pessoas puderem baixar mais filmes pela internet não irão mais ao cinema.
Ir ao cinema e assistir a um filme num computador ou na televisão são experiências diferentes. Por isso que está acontecendo algo contrário ao que Keen prevê. As pessoas estão indo mais ao cinema.
livroculto01
O escritor evolui melhor as suas idéias no capítulo final “Soluções”, quando diz que a dinâmica dos sites deve caminhar para o meio termo, nem muita ou pouca abertura. E o que estamos vendo é isso. A Wikipedia, por exemplo, aumentando a moderação, se fechando mais, e a enciclopédia Britannica se abrindo mais, permitindo a edição de alguns verbetes. Antes rivais, Wikipedia e Britannica caminham rumo ao meio termo.
Pelo que percebi o autor se dá melhor em entrevistas e em sua coluna diária de mídia no jornal The Independent. Mesmo com as observações feitas neste post, Keen consegue fazer um trabalho de pesquisa melhor que muito de seus críticos.
A quantidade de pesquisas e referências citadas no livro chama a atenção, algo raro em livros voltados para um público não-acadêmico, o que rendeu elogios até de Larry Sanger, co-fundador da Wikipedia, e de Michiko Kakutani, crítica de livros do NYTimes.
Mas sabe aquele livro que não causa nenhuma reação em você? Que não faz nenhuma diferença você ter lido ou não? Não sei quanto a você, mas foi essa a sensação que tive após ler o “O Culto do Amador” . Talvez por que tenha passado quase dois anos do lançamento do livro original (em inglês).
Em 2009, a obra vale mais pelo seu valor histórico e como consulta já que são citadas diversas pesquisas.
É meio off topic, mas...
ResponderExcluirMuito legais as versões do Leo Morel para "A day in the life" e "Paisagem da janela", duas músicas que adoro.
Oi Marcelo!
ResponderExcluirRealmente não é uma regra o melhor sempre se destacar. Mas não acredito que isso tire tanto o espaço dos bons especialistas (em determinados setores, é claro). No final, Einstein tinha razão quando dizia que "tudo é relativo!" rs
Marcelo, as músicas que você ouviu são da banda =reverse=, que já acabou, que tinha como integrante o Daniel Lopes - guitarrista, cantor e compositor - que me acompanhou durante 6 anos. São muito boas mesmo.
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