20 de mai. de 2009

Festival de festivais



Da mesma forma que nos States e Europa, no Brasil os festivais também estão espocando por toda parte. Têm até uma associação, cujo site, aliás, é muito bacana.

Sobre este fenômeno, saiu na revista Bravo essa matéria aí embaixo.

No entanto, a reportagem não toca na questão comportamental/ comunitário dos festivais. Como tem sido isso? Vocês aí atrás do mouse têm alguma coisa a dizer sobre o aussunto? Já foram a algum festival por esse Brasil afora?

* * *

A nova era dos festivais


Como nos anos 60, os novos talentos da MPB explodem em shows coletivos pelo Brasil afora. Praticamente ignorado pela TV, o fenômeno arrasta um público estimado em 250 mil pessoas por ano


Por José Flávio Júnior

O editor de música José Flávio Junior apresenta
em seu podcast
as apostas para esse ano nos festivais


Exaltar a era dos festivais — onde surgiram grandes nomes da MPB como Caetano Veloso e Chico Buarque — é um argumento clássico dos saudosistas. Bem, agora eles não têm mais do que sentir saudade: a era dos festivais está de volta. Nunca houve tantos festivais de música popular no Brasil, nem mesmo no tempo em que Nara Leão usava saia acima do joelho e Sérgio Ricardo atirava o violão na plateia. Em geral realizados em capitais brasileiras fora do eixo Rio-São Paulo, pelo menos 38 são vinculados à Abrafin, Associação Brasileira de Festivais Independentes (sim, existe até uma entidade que reúne dados sobre o assunto). De acordo com a Abrafin, em 2008 cerca de 800 artistas se apresentaram em eventos como o Bananada — cuja próxima edição ocorrerá neste mês em Goiânia —, o Rec-Beat, em Recife, e o Calango, em Cuiabá. Estima-se que tenham reunido, ao todo, um público da ordem de 250 mil pessoas.

No essencial, os festivais do século 21 têm a mesma função dos realizados na década de 1960: revelar novos talentos. No restante, e a começar pelo fato de que não são competitivos, são completamente diferentes. Essas diferenças estão ligadas às mudanças que o mundo da música experimentou nos últimos anos. A década de 60 do século passado foi o período em que a televisão se consolidou como principal meio de divulgação de música popular, superando o rádio. Os festivais eram promovidos por emissoras como a Tupi e a Excelsior. Quando apareciam na televisão, artistas como Caetano Veloso e Chico Buarque passavam a fazer parte de uma espécie de mainstream da música e, assim, conseguiam contratos com grandes gravadoras. Hoje o conceito de mainstream não existe mais. A internet vem substituindo o rádio e a televisão como principal meio de divulgação de música. As gravadoras enfrentam dificuldades financeiras, e os artistas, novos ou não, sobrevivem sobretudo de shows. É justamente esta uma das principais funções dos novos festivais: ver quem se sai bem no teste do palco.


O presidente da Abrafin, Fabrício de Almeida Nobre, de 30 anos, é vocalista da banda de rock goiana MQN. Colocou de pé seu primeiro festival porque queria um palco para tocar. O evento que ele tinha como modelo era o pernambucano Abril pro Rock, uma espécie de precursor da nova era dos festivais, que acaba de realizar sua 18ª edição. Contemporâneo do movimento manguebit, o APR revelou de cara Chico Science e Mundo Livre S/A. Em anos seguintes, deu visibilidade a grupos como Mombojó e Los Hermanos. Hoje, o festival não atravessa sua melhor fase, apresentando uma programação bastante enxuta e menos atraente do que a dos "rivais" Rec-Beat e o No Ar Coquetel Molotov, ambos sediados em Recife.

Para Fabrício, uma das principais contribuições da Abrafin foi ajudar a formatar um calendário nacional de festivais. As datas dos eventos são publicadas no site da associação (www.abrafin.org), que também explica os conceitos de cada festival e informa quem são seus responsáveis. Ainda que a crise mundial tenha empurrado para o segundo semestre vários eventos que deveriam ocorrer no primeiro, ela não ameaça a continuidade dos que já estão estabelecidos. "A melhor definição para um festival independente é: independentemente do que aconteça, ele acontece", diz Fabrício.

Para uma banda iniciante, os festivais podem ser estratégicos, uma vez que reúnem tribos distintas na plateia. O grupo de rock Móveis Coloniais de Acaju, de Brasília, resolveu em 2005 que investiria tudo nesse circuito, com os nove integrantes custeando o alto preço das viagens. A banda começou tocando, nos piores horários, em festivais como o extinto Curitiba Rock Festival. Graças a performances interativas e arrebatadoras, o Móveis foi conquistando fãs e hoje é chamado para ser a atração principal em vários eventos. Os produtos com o logotipo do grupo disponíveis nas barraquinhas vão de abridores de garrafas até espelhinhos femininos. Tanto destaque nessa cena rendeu um contrato com a gravadora Trama, que lança o segundo álbum dos brasilienses neste mês (leia a resenha na página 49).

Muitos desses festivais nasceram totalmente dedicados ao rock. Mas outras expressões musicais — muitas regionais, caso do tecnobrega e da guitarrada no Se Rasgum, de Belém, e do siriri e do cururu no Calango, de Cuiabá — foram ganhando espaço, sem alienar os adeptos do som mais pesado. É o inverso do que aconteceu nos festivais dos anos 60, cuja audiência rechaçava flertes com a "música americana". No Festival Internacional da Canção de 1968, Caetano Veloso lançou uma diatribe contra os que o apupavam durante a execução de É Proibido Proibir, em ruidoso arranjo dos Mutantes. Ficou famosa a passagem "Mas é isso que é a juventude que diz que quer tomar o poder? Vocês não estão entendendo nada!". Que bom que Caetano está vivo para ver que o futuro é muito melhor do que aquele previsto em seu discurso. A juventude entendeu tudo. E está fazendo acontecer.

Onde e quando
Festival Bananada. Centro Cultural Martim Cererê (rua 94-A, Setor Sul, Goiânia, GO, tel. 0++/62/212-5315), a partir das 17h. Dias 22, 23 e 24. R$ 20 (por dia). www.myspace.com/bananada

7 comentários:

  1. Marcelo,ano passado participei do festival Garimpo aqui em BH, essa cena indie ganha uma força incrível a cada dia que passa, o Bananada se tornou vestibular pra muitos artistas novos, quem consegue chegar lá e passar, costuma fincar o pé na carreira.

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  2. Legal saber que o circuito deu certo para alguns artistas. É claro que só os melhores e mais persistentes conseguem furar a barreira do anonimato no meio de tantas bandas.

    Pelo texto vem outra observação importante: tem que haver investimento por parte das bandas. normalmente, durante muito tempo. É que nem entrar na faculdade: gasta-se com mensalidades, transporte, livros etc. por quatro anos. E depois ainda rola um bom tempo antes da profissão sustentar o novato.

    É ralação. E só os mais dispostos e preparados vão ter resultados.

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  3. Minha banda já tocou algumas vezes no Bananada e lançamos o nosso primeiro disco pela Monstro Disco que é a produtora que organiza dois dos maiores festivais do rock independente do país: o próprio Bananada e o Goiania Noise. Não sei se ocorre o mesmo em outras cidades do país, mas em Goiânia, nos anos 80 e meados de 90 o rock independente era algo pouco profissional. As bandas ensaiavam no palco, os equipamentos de som eram ridículos (geralmente cada banda levava alguma coisa, uma caixa amplificada, um cubo de baixo, uma bateria), poucos conseguiam gravar um disco e quando gravava era de péssima qualidade. Mas, multiplicavam-se fitas demos, com quatro ou cinco músicas, muitas delas, gravadas em ensaio. Não havia nem um pouco de profissionalismo, mas os ingressos eram baratos e muita gente com pouca condição financeira estava nos shows.
    No final dos anos 90, houve uma grande virada. As bandas passaram a apresentar um som impecável, as gravações de CD começaram apresentar uma qualidade "quase" comparável às bandas de grandes gravadoras, algumas bandas foram gravar nos EUA, outras contrataram ainda que do próprio bolso grandes produtores para fazerem o trabalho. Mas, tudo ficou mais caro. E ainda hoje, nenhuma banda do rock independente de Goiânia vive da própria música. Alguns rockeiros vivem de organizar festivais, como no caso dos camaradas da Monstro. Mas, nenhuma banda ainda ganha um cachê pra tocar. O que quero dizer é que a cena independente ganhou em profissionalismo, em exigência, mas, isto não retornou financeiramente para as bandas. Será que esse caminho dos festivais independentes poderá algum dia gerar renda para as próprias bandas e nao só para os organizadores?

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  4. Móveís coloniais, Vanguart, Pitty, saíram desses festivais, no momento não estou me lembrando de outros nomes, mas deve haver mais.

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  5. Señores, a vida está dura, não está? Nos momentos em que você está em evidência num desses festivais tem que divulgar o site e oferecer algum presente para atrair seu público e conseguir cadastrá-lo. Aí começa uma relação on-line de divulgação das suas atividades que é independente dos festivais.
    Mas acredito que sem os festivais muitas bandas não teriam a chance de aparecer.
    Uma hora a coisa muda. Mas pode levar tempo.
    Dê um pulo no meu site para dar uma olhada nas Dicas de Sobrevivência do Músico no Mundo Digital.
    Boa sorte! E perseverança...

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  6. Pessoal dêem olhada nesta matéria sobre "Bandas e Festivais Independentes" scrita por Anderson Foca, que é músico e organizador do Festival DO SOL em NATAL. http://ogritodoinimigo.com/index.php/2009/05/as-bandas-e-os-festivais-independentes-por-anderson-foca/
    Ele fala sobre a nova realidade dos festivais e do retorno financeiro para as bandas. Elegi algumas citações que contribuem muito para este debate aqui:

    "Uma distorção que tem acontecido muito é tratar um festival de música independente como se ele fosse um potencial contratante de bandas, quando na verdade um evento com essas características é uma plataforma para que as bandas busquem mercado dentro das cidades"

    "Na Europa isso é muito mais corriqueiro que aqui. Por lá uma pequena banda que toca no palco 3 do Glastonbury por exemplo tem a mesma (ou se não menor) ajuda do que as bandas nacionais por aqui. A diferença é que lá essas bandas estão em tours extensas, passando vários meses na estrada e montando um mapa viável para se divulgar. Como 99% das bandas nacionais são bandas “de fim-de-semana” a coisa complica. Só que é mais fácil culpar o vizinho pelo mal cheiro, do que olhar a própria privada"

    " Fiz uma conta rápida e básica para ver quanto uma banda (de quatro pessoas) custa para um festival sem contar com ajuda de custo para chegar no mesmo:

    Alimentação: 100,00

    Hospedagem: 200,00

    Translado: 150,00

    Despesa no show (camarim, bebida): 60,00

    Só nesses itens a brincadeira já dá mais de R$500,00 e não estamos nem colocando o investimento de marketing do festival para promover a banda, dentre outros itens mais difíceis de calcular. A maioria dos grupos que reclama, não consegue fazer R$500,00 de bilheteria nem dentro de casa. Imaginem fora."

    "Uma coisa é certa, banda tem que ter música boa, tem que ter um network, ser empreendedora dentro da sua região, ter tempo para o projeto, estar envolvida com a cena local em todos o sentidos e ter noção de como as coisas funcionam. Se não for desse jeito o projeto não sai do canto e aí você vai ter que escolher entre relaxar e trata-la com um grande hobby sem pretensões ou virar um chorão de blogs ou orkut."

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  7. Adorei o texto, Rafael. Li o artigo inteiro e percebi que o mais importante está aqui.

    O negócio é que todo mundo acha que tem que ter um pai para dar tudo de mão beijada.

    Tem muita gente reclamando que os festivais estão enriquecendo às custas das bandas. É um tal de chorar contra qualquer autoridade...

    Programar um festival desses deve ser um trabalho enlouquecedor! E, no final, a grana não deve compensar mesmo.

    A estrada é longa e difícil. Construir uma carreira é subir ladeira na chuva.

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